ultimamente, perco com facilidade o sono pela noite, busco silêncio completo, distraio-me da vida e fico concentrado em uma viagem de minha mão na barriga de minha companheira. ela, adormecida, embala a viagem a espera de nossa filha. atento a qualquer sinal de comunicação que a Mônica venha a dar, com a mamãe já em sono profundo, sonho acordado. não tenho ela dentro de mim concretamente, mas o elo amoroso, como uma banho de cachoeira, invade cada poro do corpo. contato inexplicável que se passa entre minha mão, a barriga de "minha barriguda" (quase maior que a minha já) e a Monikinha.
quietinho, sintonizado a barriga, paro de respirar e tomo um susto gostoso a cada chute que ela dá. me surpreende a cada gesto e, como a mãe dela, me encanta e me diverte com suas travessuras já começadas e inscritas em um universo por vir. que vontade de pegar esse pezinho que chuta avisando que logo chegará para bagunçar a casa. que desejo de niná-la, de ficar horas a brincar com ela e de ver o tempo passar, de ver todos os acontecimentos e tropeços inventivos que passará, passarinho...
um livro ainda não escrito se inscreve, no momento, neste contato mão-barriga-chutes-afetos de corpos. tento imaginar os destinos que iremos traçar em conjunto, mas sempre escapa, é inimaginável como uma estrela cadente que, como tal, nunca se sabe onde irá parar.
devir gravidez.
promessa de vida no coração, potência animalesca que não cessa de dizer sim. a vida pode mais que o horizonte posto!
existe maneira melhor para se começar um ano que, politicamente, promete ser sombrio? o nascimento é o instante da paixão, que, como uma onda na beira da praia, tem a potência de apagar pegadas marcadas na areia para um recomeço. que o ano venha e nos surpreenda com vidas indomáveis pelas rédeas daqueles que desejam para trás. a vida é para a frente, nos arrasta feito as crianças que puxam seus pais pelas mãos em suas excitações frente a um mundo por descobrir. azul e rosa são belas cores, entretanto, não dão conta de colorir com canetinhas uma vida desenhada em um papel. o mundo está muito mais para arco-íris do que para tv em preto e branco...