domingo, 29 de setembro de 2013

AINDA É CEDO


Um dia desses assisti ao filme “Somos tão jovens” que trata da vida de Renato Russo, guia musical/poético de algumas gerações brasileiras. Saí do filme angustiado, com um nó na garganta, com a alma desacomodada e um tanto perdida frente ao mundo. Em se tratando do filme é importante comentar que não é nada demais, com um roteiro um tanto pobre e preocupado em fazer uma sequência perfeita da vida do cantor. Contudo e para, além disso, o fato é que o filme foi uma rememoração do passado, dos sonhos, das expectativas sobre a vida que já tive e que compartilhei com muitos amigos. Sonhos coletivos, desejos revolucionários e algumas ideologias ingênuas em épocas remotas e hoje em dia tão distantes. Literalmente um tapa na cara frente ao que fiz com o meu destino. Em minha opinião o filme poderia ter outro título, a saber: “Ainda é cedo”.

Ainda é cedo para rememorar tais emoções, afetos, vontades de vida que durante a juventude eram tão claras, brilhantes e possíveis. Olhar para esse lugar produz um susto sem tamanho, faz repensar tudo que se viveu, todas as escolhas que foram afunilando cada vez mais a caminhada pela vida. O processo de se “adultizar” parece, de certa forma, nos tornar menor, quase que como se estivéssemos a cada ano sendo espremidos pelos passos que damos no nosso percurso patético pela terra. A cada dia escolhemos algo e essa ação mata milhões de outros possíveis, sonhos que vão ficando no caminho. Eu sei, isso é muito re-sentimento, mas, não estamos livres dele...

Como já escrevi, ainda é cedo para se a ver com tais sonhos colocados para baixo do tapete, reprimidos e transformados em fantasmas que rodam nosso cotidiano posto e acinzentado. Parece que à medida que envelhecemos os sonhos são perdidos na mesma velocidade que as angústias vão aumentando. É um pouco o que Freud nos traz em Mal estar na civilização: se prevenir da infelicidade já é uma grande felicidade, isto é, não nos produzindo angústias já está de bom tamanho para aguentar esse mundo sem sonhos.

O sonho de liberdade propagandeado no social é instalado desde a mais tenra infância. Na adolescência tal ideal chega ao ápice, temos a certeza de que estamos nos libertando cada vez mais, não se sabendo bem do quê, mas algo parece existir, indo além do que se vive, uma esperança que no futuro a liberdade se efetivará. Doce ilusão, ao menos para mim, não sei se todos compartilham, o sentimento é que a cada dia se fica mais amarrado, mais dependente das escolhas que produzimos. As escolhas nos escravizam... Como ir para outra direção depois que nos acomodamos num determinado destino? Como voltar para trás, como correr por caminhos desviantes depois que afirmamos escolhas ao infinito do Universo? Que bárbaro sufocamento é essa vida! O filme Morangos Silvestres de Ingmar Bergman trata disso também. As horas da vida vão passando e os desejos vão se esvaindo como a areia que corre na ampola do tempo. É um sentimento de vertigem que nos abarca ao nos darmos conta do afunilamento do viver. Andamos cambaleando pelas calçadas como o professor exemplar de medicina Isak Borg, condecorado pela Universidade por seus trabalhos prestados mas que não enxerga sentido para os passos que deu ao longo da vida.

Não posso desejar nessa produção de vida angustiante outra coisa senão um retorno à infância, lugar de escolhas ainda rasas, que não têm um enraizamento no qual o andar fica paralisado. A criança brinca de escolher, escolhe uma porção de coisas e depois desiste sem a menor cerimônia. Não se cansa de percorrer caminhos inusitados, se diverte com o estranho ao invés de se aterrorizar e, sobretudo, não se apega a percursos já demasiadamente explorados e cotidianizados. Faço uma ode ao devir criança para tensionar essa “adulteza” que nos deixa tão rasos de sentidos! A estratégia é levar o acaso como potente amigo para sabermos ouvi-lo e aproveitarmos as possibilidades que nos oferece para deslizarmos por esse tempo-espaço que a cada dia nos constrange e nos envelhece. Deixo, para finalizar, a música mais nietzschiana dos Los Hermanos no intuito de nos inspirarmos...


http://letras.mus.br/los-hermanos/67551/

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